sábado, 19 de novembro de 2011

Conto Maraguá

A menina e a arara

              A menina ganhou uma arara. Era bela, de cor vermelho-escuro. A ela deu o nome de Linda.
               Linda era selvagem. Ela havia sido capturada , quando sem poder, debaixo de uma bruta chuva, via seus dias chegando ao fim quando dois rapazes que passavam por perto a viram assustada em cima de uma arvore seca. Voltaram, e deram-na de presente a menina. Ela, porém nunca se deixou domesticar.
                A menina passava horas tentando fazer amizade com Linda. Dava-lhe comida, conversava com ela e procurar dar carinho, mas a arara não aceitava.
               - Talvez se ela tivesse nascido em casa. – Dizia o pai. – Quem sabe fosse diferente.
               Mas a pequena não perdia a esperança.
               Numa manhã, enquanto fazia sua primeira refeição do dia, a menina ouviu gritos de muitas araras sobrevoando a casa. Correu para ver e se deparou com uma dezena de araras pousadas próximo ao poleiro de Linda.
               Foi a primeira vez que a menina via a arara feliz. Ela gritava e se debatia tentando escapar da linha que a prendia ao poleiro. Mesmo assim era como se estivesse entre as demais.
               Elas ficaram ali e depois voaram para bem longe. A arara voltou a ficar triste.
Pensativo a menina soltou a arara para ficar livre das amarras.
               -Mas se ela fugir? – Disseram.
               A menina não tinha escolha. Queria ver a arara feliz.
               No outro dia, apareceram novamente as mesmas araras. Sua arara, alegre voou e foi estar com as outras na copa da arvore.
               No por do sol, elas voaram e foram embora, mas a arara da menina ficou. Voltou para o poleiro. Foi a primeira vez que a menina pode dar comida em seu bico e fazer cafuné em sua cabeça.
              A menina entendeu então a importância da liberdade. Contente ele foi dormir. Só não imaginava que aquela seria a ultima noite em que a arara estaria com ela.
              Na terceira vez em que suas irmãs araras foram lhe visitar, chegando o por do sol, quando elas foram embora, a arara foi junto. A menina olhando, se pos a chorar.
               Dias passaram, até que numa vez, sem esperar as araras voltaram. A menina correu para ver e reconheceu sua amiga arara em meio às outras. A arara voou até o poleiro e como estivesse se despedindo deixou a menina afagar-lhe mais uma vez sua cabeça. Depois retornou a copa da arvore. Quando a noite chegou, voou junto com as outras. Dessa vez se foi embora para nunca mais voltar.



quinta-feira, 17 de novembro de 2011

O POVO DAS HISTORIAS DE ASSOMBRAÇÃO



                 Conhecidos por suas historias de fantasmas, os Maraguás tem em sua mitologia uma rica e variada cultura de seres e visajes. Desde criança, quando passam a ouvir as historias tradicionais, os maraguás se dedicam a contação de historias.                                
                Aprimorar a arte valorizando o suspense passado nos melhores horários é sempre o desejo dos contadores de historias. Historias de fantasma é o bom nos momentos de descontração, principalmente aos por de sol.
             Quando chega a noite e a escuridão toma conta da aldeia, os adultos vão se achegando a mirixawaruka – casa de conselho, e aos poucos é iniciada a sessão de historias que pode durar horas – boa parte da noite. As crianças também têm seus momentos de contação de historias, que são as fabulas e contadas geralmente pelos malylis ou outros contadores de historias. Mesmo assim, preferem a sessão dos adultos, onde as visajes ganham temas especiais.
               Na mitologia, as entidades têm grande importância para a natureza. As visajes também, mas algumas são malignas por demais deixando a proteção do meio ambiente em segundo plano. As visajes e seres fantásticos da natureza são muitos e todas habitam a crença dos moradores do rio Abacaxis.
             Sendo base da antiga religião, as entidades se dividem em classes segundo a ordem dos seres e de seus poderes. Alem dos deuses Anhãga e Monãg, do semi-deus Wasiry e dos espíritos protetores Tapirayawara, Çukuywéra, Ka’apora’rãga, Pirá’ákãg, Yanawy e Kaçawawaçú’rãga, (que fazem parte das histórias de origem e são tidos como sagrados) existem as entidades que dão medo:
             Waurãga  – Que em língua sateré recebe o nome de “ga’apy’sy” são as mães-da-mata que protegem seu espaço e o lugar onde habitam. 
             Wãkãkã ou Myra’ãga – são as visajes (assombrações e fantasmas) propriamente ditas. Procuram só fazer o mal. Os que pertencem a essa classe são: Kunhãgwera, Pó-kwára, Pi~to-piroka, Ipuré, etc.
            Seres – são entidades cujos corpos mais se aproximam do ser humano. Eles são muitos, os principais são: Guayára, o Mapinguary, os Jumas e os Kurupyras. 
           Encantados - São seres que não foram criados por nenhum deus ou semi-deus. Segundo a religião Urutopiãg, já existiam antes de haver mundo. São eles: A Pirayba, a Jiboia, a Boiaçú e os Wiára – ou botos-gente (também chamados de companheiros do fundo) que habitam as cidades encantadas do fundo dos rios amazônicos.
         Waurá-kãkãnema – são os amimais propensos a manifestação das visajes denominadas Waurá-anhãga (visajes que precisam de corpos para se manifestar), das waurãga ou de pessoas que por pacto com o espírito mal, são capazes de se transformarem em visajes e assim “malinar” dos caçadores, dos pescadores ou qualquer pessoa que tenha despertado sua raiva.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

PALAVRAS ALADAS, MISTICISMO NO MEU POVO MARAGUÁ


               As palavras que voam e dão formas a seres emplumados gigantescos estão no intimo da cultura do povo indígena Maraguá. Um povo indígena que habita o território Maraguapajy, o país dos maraguá, localizado no rio Abacaxis, Amazonas e falantes de um dialeto que mescla aruak e nhengatu.
        As palavras ali voam e nesse sentido criam formas conforme vão saindo da boca do morõgetánhe~gaçara, o tradicional contador de historias de assombração, na essencial sessão de historias contadas ao pé da fogueira e dentro da mirixawaruka, a casa do conselho, onde anciãos deitados nas redes são rodeados por mulheres e crianças atentas as narrativa em que se revezam. Tudo isso no nobre horário das seis horas da tarde. Sessão que pode demorar horas, conforme a quantidade de historias.
             Historias de assombração é marca na cultura dos maraguá, índios que tem o apelido regional de “o povo das historias de assombração” E o que faz justiça ao nome são as muitas historias de seres alados devoradores de alma de gente, como o famigerado kãwéra - inimigo mortal dos maraguá em sua religião tradicional.
       Assim são os Maraguás e suas historias. A vida e o cotidiano nas aldeias são repletos de magia trazidas pelas contações das historias aladas.



 yaguarê yamã
escritor, professor, ilusrador e geografo